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Zine de Pão

Caderno de notas sobre farinhas, leveduras e temperaturas

Zine de Pão

Caderno de notas sobre farinhas, leveduras e temperaturas

04.Fev.11

Tipos de fermento

Tipos de fermento

Tão iguais e ao mesmo tempo tão diferentes são os tipos de fermento que se usam para pão. Diferentes texturas, diferentes propriedades, aspecto diferente mas no fundo o mesmo tipo de levedura. Começando da esquerda para a direita no sentido dos ponteiros do relógio, temos fermento fresco de padeiro, fermento selvagem ou isco (ainda estou a investigar se é o nome correcto) e por último o fermento em pó ou granulado. O primeiro e o último pertencem à categoria de fermento fabricado/industrial e o outro é um fermento natural.

 

Até aos finais do século XIX o fermento mais utilizado era o fermento selvagem, normalmente personalizado por um pedaço de massa velha que era guardado de fornada em fornada. Nestes tempos, ninguém percebia muito bem como a fermentação funcionava e também não se preocupavam com isso. Limitavam-se a atribuir o processo a uma causa divina qualquer (em Portugal, nalgumas terras ainda se tem de a tradição de dizer uma benção quando se deixa o pão a levedar).

 

As coisas continuaram assim, até um senhor chamado Louis Pasteur, também responsável pelos processos de pasteurização, ter descoberto que a fermentação ocorria graças a um organismo vivo: a levedura. Pasteur, ele próprio muito religioso, acabou por aceitar o paradoxo da sua descoberta, ao argumentar que a levedura era também em si uma criação de Deus. A fermentação continuaria assim a ser um processo com alguma intervenção divina. A ciência pegou na sua descoberta e tomou as rédeas da selecção natural e escolheu as espécies de levedura mais fortes (i.e. levedam mais rápido) para produzir o fermento fabricado. Os padeiros jubilaram de alegria e o fermento selvagem caíu em desuso. Começara a era da industrialização do pão.

 

Gosto de História, mas vamos lá falar de fermentos. Qual devemos usar? Como devem ser usados? Qual o melhor?

 

Não existem grande diferença entre o fermento fresco e o fermento granulado. São ambos a mesma espécie de levedura, produzem os mesmos tempos de levedação e portanto pode-se substituir um pelo outro em qualquer receita. A fórmula a ser usada é: fermento granulado (g) = 0.4 x fermento fresco (g), que significa que numa receita que use 10 gramas de fermento fresco podemos usar 4 gramas de fermento granulado e não afectar em nada o resultado da receita. É uma boa dica a reter. A grande diferença é que o fermento fresco tem uma validade de três semanas após a data de fabrico ao quanto que o granulado tem validade de um ano se a embalagem não tiver sido aberta. Além disso, o fermento fresco deve ser sempre dissolvido em água antes de se adicionar a farinha ao passo que o granulado pode ser adicionado e misturado com a farinha. Pessoalmente, acho o fermento granulado mais prático.

 

Por outro lado, o fermento selvagem é um tanto quanto diferente do fermento fabricado e, que eu saiba, não existe nenhuma fórmula de conversão directa. A principal diferença é que este leveda mais lentamente, mas ao fazer isto dá tempo a outro tipo de organismo presente numa massa de pão fazer o seu trabalho: as bactérias. "Credo! Bactérias!" - dizem vocês, mas estas são das boas. As bactérias presentes numa massa produzem ácido láctico e ácido acético e contribuem para um sabor mais complexo. Segundo DiMuzio, um pão com uma pequeníssima quantidade de fermento de fabrico leveda pães em cerca de 1-2 horas, ao quanto que as bactérias precisam de pelo menos 3-4 horas para produzirem estes ácidos. Todavia, é possível obter resultados parecidos com o fermento fabricado recorrendo ao uso de pré-fermentos (tema para outro post no futuro). O próprio isco é um pré-fermento de leveduras selvagens.

 

Resumindo, não existe nenhum fermento melhor que o outro. Todos têm características diferentes que podem ser/são usadas pelo padeiro para obter resultados diferentes. O que devia ser a maior aprendizagem deste post é que os tempos de levedação são importantes e não devem ser apressados. Aumentar a quantidade de fermento numa massa ou coloca-la a levedar num ambiente mais quente para que esta levede mais depressa produz pão num curto espaço de tempo, mas também produz um pão menos interessante.

6 comentários

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    Paulo 18.02.2011

    Difícil dizer, quando o recebeu refrescou-o alguma vez ou tentou usá-lo logo para fazer päo? Seguiu alguma receita do blogue ou improvisou? Também me acontece algumas vezes e ainda não consegui precisar qual é o problema. Normalmente está relacionado com o isco estar "adormecido". A mim acontece-me muito deixar mais de 12h à temperatura ambiente após o último refresco, o que causa que as leveduras acabem por estar meio adormecidas e não levedarem o pão rapidamente.

    O que diz sobre o aspecto soa totalmente correcto, como um fermento que está vivo. Pode ter sido outras variáveis.. com a sua experiência de fazer pão já deve saber o quão este pode ser tão sensível a mudanças de temperatura, quantidades de água, etc.

    Pode usá-lo quando quiser. Aliás, podia já tê-lo usado após esse refresco. O importante é na altura de fazer pão ter um isco que está vivo e cheio de força e bolhas, daí ser costume na noite anterior a fazer pão fazer um isco "maior".
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    M.Luzia 18.02.2011

    Obrigado pela pronta e rápida resposta.

    Normalmente eu sou o oposto da minha filha, costumo improvisar muito. Na maior parte dos casos resulta, outros nem por isso. Fazendo uma análise, acho que o isco que a minha filha me deu, estava adormecido sim. A massa até estava com uma boa consistência, ficou tempo suficiente a descansar e nada...
    Quando refresquei pela primeira vez o isco, já com farinha de trigo, ficou mais de 12 horas na temperatura ambiente.

    Estou neste momento a fazer pão com ele, se tudo der certo, vou experimentar guardar um pouco da massa para fazer o pão alentejano. Guardo hoje e faço na segunda-feira.

    Mais uma vez, obrigado.
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    Paulo 18.02.2011

    Eu sou como a sua filha então, sigo a receita à risca. :)

    Depois conte como correu com o pão de hoje. Boa sorte!
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    M.Luzia 18.02.2011

    Bem... nem me arrisco a colocar a massa no forno. Não sei o que se passa mas não cresceu absolutamente nada desde que a amassei. Estou confuso, pois nunca tal me aconteceu. Das vezes que faço pão, tenho usado o fermento de padeiro que se compra (no meu caso compro no PingoDoce) e em pouco tempo a massa começa a encorpar. Diferenças de temperatura? Não, pois está bem agasalhada e não apanhou correntes de ar. Desta vez fiz com quantidades e não a olho. O que poderá estar a acontecer? Só vejo uma razão: o isco. Que me pode dizer?
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    Paulo 19.02.2011

    Se quando refresca o isco, passadas as 12h este ter dobrado de tamanho é sinal que o problema não está no isco.

    Quanto tempo está a deixar a massa fermentar? As massas com fermento de padeiro fermentam muito mais rápido. Como exemplo, ainda hoje fiz um pão somente com isco que demorou 3 horas até se notar algum crescimento e depois deixei-o mais uma hora e meia a fermentar.

    Uma boa sugestão é deixar a massa a fermentar dentro do frigorifico durante a noite. Vai ver que quando acordar no outro dia esta terá crescido bastante (ás vezes até para fora do recipiente..).

    É bastante diferente fazer pão com o fermento de padeiro ou fermento granulado quando comparado com fermento selvagem. Os tempos de fermentação são bastante mais longos. Talvez esteja habituado aos tempos de fermentação dos outros tipos de fermento, deixe a massa fermentar mais tempo pois eventualmente há de crescer. Eu ás vezes também tenho tendência para pensar "Não vai crescer, o fermento está morto" mas acaba por crescer tanto fora do forno como também dentro do forno.
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