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Zine de Pão

Caderno de notas sobre farinhas, leveduras e temperaturas

Zine de Pão

Caderno de notas sobre farinhas, leveduras e temperaturas

10.Jan.11

Cortes e mais cortes

Para os que acham piada a estas coisas, vejam este vídeo de uma padaria aqui em Estocolmo. Além de ajudar o padeiro a fazer crescer o pão de uma maneira controlada, i.e. não rebentar a côdea por pontos onde não se quer, fazer cortes na massa antes de entrar para o forno tem o objectivo de fazer pães extremamente bonitos de se ver e comer!

 

09.Jan.11

Pão de Cinco Grãos

ingredientes para o pão de cinco grãos

Depois do sucesso do Pão de Aveia com Canela e Passas cá em casa, decidi dar outra oportunidade a um outro pão de massa enriquecida. Desta vez, encontrei este interessante pão com o nome "Pão de Cinco Grãos", receita do excelente Bread, em que usa trigo, centeio, aveia, milho e linhaça. Este último é um grão aparentemente com uma mão cheia de benefícios para a saúde.

 

Disse noutro post que não sou pessoa de pães de massa enriquecida porque maior parte são pães de forma e não existe qualquer fase de tender o pão, coisa que eu acho divertida. No entanto, este pão pode ser tendido de qualquer forma e feitio: bolinhas, pães oblongos (bâtard) ou redondos (boule) ou até experimentar uma nova forma: fendu.

 

O nome soa mais a algo relacionado com feng shui do que propriamente com a arte da panificação. O nome completo é pain fendu, presumo eu que venha da escola de panificação francesa. É apenas um pão com uma fenda no meio... a nossa carcaça! É um formato que pode ser usado em pães redondos ou oblongos e permite-nos saltar o passo de fazer cortes no pão antes de este entrar no forno, pois a própria fenda expande para formar dois lados do pão simétricos.

tender o pão em forma de carcaça (fendu)

Como fazer? Fácil! Tendam o vosso pão em bola ou oblongo e deixem o glúten relaxar durante uns 5 minutos. Se saltarem este passo, vão ver que ao tentarem fazer a fenda, esta vai simplesmente rapidamente voltar ao lugar e não é isso que queremos. Se os 5 minutos não forem suficientes esperem. Não há pressa, pão é slow food.

 

Enfarinhar a bancada liberalmente, de modo a que o pão não pegue à bancada quando fizerem a fenda com o rolo de massa. Coloquem o pão no topo da superfície enfarinhada, coloquem mais farinha ao longo do pão no sítio onde vão pressionar para fazer a fenda. Eu uso um rolo que tem aproximadamente 2-3 cm de diâmetro para os pães grandes e para as bolinhas ou carcaças uso o cabo de uma colher de pau grossa (1-2cm). Pressionem no meio do pão até ficarem com um vale no meio do pão com uma espessura de um pouco menos de meio centímetro. Amassem para trás e para a frente cuidadosamente, de modo a não romper a massa, para aumentar a largura da depressão (uns 5-6 cm em pães grandes). Limpem algum excesso de farinha que possam ter na fenda, cuidadosamente juntem as duas partes pelas extremidades e façam pressão para fechar criando assim as famosas "maminhas" da carcaça.

 

A segunda fermentação deve ser feita com a fenda para baixo, i.e. de pés para o ar. No meu caso usei cestos de levedar que comprei precisamente para o pão, mas podem recriar o mesmo usando um alguidar e um pão bem enfarinhado.

 

Na altura de cozer o pão é só virar o pão para cima de um tabuleiro de forno (com papel vegetal se desejarem) e colocá-lo no forno bem quente. A abertura criada pelo rolo da massa vai expandir e ficar com um aspecto maravilhoso.

Miolo do pão de cinco grãos depois de arrefecer.

Este pão não é para todos. Tem um miolo bastante compacto e um sabor forte a linhaça (e eu só usei 1/3 do que a receita indicava). É daqueles pães em que ficamos cheios ao fim de uma ou duas fatias. Podem tentar aumentar a quantidade de água e ver o que acontece, vai ser preciso é amassarem durante mais tempo.

Pão de Cinco Grãos

Esponja

  • 110g flocos de aveia
  • 110g sementes de linho (linhaça)
  • 80g farelo de trigo
  • 80g farinha de milho (pode ser polenta)
  • 460g de água fria
A esponja deve ser preparada no dia anterior antes de cozerem o pão. O objectivo é humedecer e tornar macios os grãos mais duros, que caso contrário dificultariam a formação do glúten pois iam cortar as ligações. Para preparar a esponja é só misturar tudo numa taça e tapar com película aderente de modo a evitar que a humidade escape. Deixar repousar durante 12h (pode ser colocado no frigorifico).

Massa final

  • 450g farinha de trigo especial para pão (proteína 11-15%)
  • 360g farinha de trigo integral
  • 90g farinha de centeio integral
  • 45g óleo vegetal (3,5 colheres de sopa)
  • 2 ovos
  • 25g de sal
  • 22g fermento
  • 360g de água
  • A esponja preparada no dia anterior
Eu usei a minha máquina de amassar para amassar lentamente durante 3 minutos e depois com um pouco mais de velocidade durante 3-4min. Se a massa não vos parecer ainda bem trabalhada, deixem repousar e deixem a máquina continuar durante mais 2 minutos. Colocar num recipiente ligeiramente oleado.

Deixar fermentar durante 2 horas. Ao fim da primeira hora, esticar e dar umas dobras à massa.

Dividir a massa em três pães de 700g e tender à forma desejada.

Aquecer o forno a 250ºC e deixar o pão levedar entre uma hora ou hora e meia.

Quando levedado, colocar dentro do forno e fazer vapor (garrafa de spray com água, apontar ás paredes do forno). Pode ser necessário baixar a temperatura para 200-220ºC a meio da cozedura, porque esta massa tem ovo que faz a côdea caramelizar mais depressa. Os pães de 700g demoram 40 minutos a ser cozidos ou até a temperatura interna do pão ser de 92ºC.
06.Jan.11

Crescente Isco de Centeio: Resumo

Em vez de ter três posts diferentes sobre como podem criar o vosso próprio crescente isco de centeio, decidi resumir tudo num post esclarecedor onde também existe espaço para um pouco de Perguntas & Respostas.

isco fermento sourdough starter balança

Isco de Centeio

Dia 1 - manhã

  • 30g de farinha de centeio (de preferência ecológica)
  • 100g de água tépida
  • 1 colher de chá de mel
Num recipiente misturar a farinha e a água. Se quiserem ajudar as leveduras a acordarem da sua hibernação, podem adicionar uma colher de mel, mas é opcional. Meter película aderente na boca do frasco e colocar num sítio morno (24-25ºc) como por exemplo o armário por cima do frigorifico.

 

Abanar o frasco ligeiramente de 12 em 12 horas.

Dia 4 - manhã

  • 90g de farinha de centeio (de preferência ecológica)
  • 100g de água tépida
O nosso isco já deve ter algumas bolhas um cheiro mais avinagrado, portanto vamos adicionar a farinha e a água ao isco, misturar bem e voltar, colocar a película aderente e deixar repousar no mesmo sítio morno.

Dia 4 - noite

  • 50g de isco de centeio
  • 60g de farinha de centeio (de preferência ecológica)
  • 100g de água tépida
Nesta altura, o nosso isco deve estar ainda com mais bolhas de ar. Se tiverem um frasco de vidro, vão conseguir ver bolhas no lado do frasco, caso contrário podem esperar mais umas horas e depois continuar com o resto do processo. Deitar fora todo o isco excepto 50g. Adicionar a água e a farinha, misturar e deixar repousar.

Dia 5 - manhã

  • 50g de isco de centeio
  • 112g de farinha de centeio (de preferência ecológica)
  • 100g de água tépida
Deitar fora todo o isco excepto 50g. Adicionar a água e a farinha, misturar e deixar repousar. Desta vez, vão obter uma mistura mais consistente, uma espécia de mousse de chocolate.

Dia 5 - noite

  • 50g de isco de centeio
  • 100g de farinha de centeio (de preferência ecológica)
  • 100g de água tépida
Repetir o mesmo processo que se fez de manhã, mas com as quantidades referidas em cima. Se quiserem, podem neste momento fazer uma marca com uma caneta ou fita-cola da altura do isco no jarro. Vai-nos ajudar para amanhã.

Dia 6 - manhã

Se tudo correu como esperado, o nosso isco cresceu bastante durante a noite e parece-se com isto. Se não cresceu como esperado, continuem a repetir os passos da noite do Dia 5 de 12h em 12h até este ganhar força. Podem, alternativamente, deixar o crescente repousar durante um período de mais de 12h e ver o que acontece.

Quando estiverem contentes, fechar o recipiente e colocá-lo no frigorífico.

O vosso isco está vivo e precisa de ser refrescado a cada semana (mais coisa menos coisa). Para refrescar um isco, faz-se o mesmo processo de sempre: a 50g de isco adicionar 100g de farinha de centeio e 100g de água, deixar repousar durante 12 horas e colocar novamente dentro do frigorífico. Se desejarem podem lavar o frasco antes de refrescar o isco, lembrem-se apenas de guardar os 50 gramas noutro recipiente!!!

Perguntas e Respostas

Já tentei uma vez fazer um isco mas criou bolor. Posso fazer alguma coisa para prevenir?
Pessoalmente, nunca tive nenhum problema com bolor. No entanto, há pessoas que antes de colocarem um isco a repousar adicionam uma camada fina de farinha no topo do isco e dizem que isto previne a criação de bolor à superfície. Caso não sejam esquisitos, também há casos em que apenas se remove um ou dois centímetros do topo do isco apenas para remover o bolor. Podem experimentar por vossa conta e risco.

Pânico. Passaram 15 dias desde a última vez que refresquei o meu isco? O que faço?
Calma. As leveduras presentes num isco são bastante resistentes e em falta de comida costumam apenas hibernar. Refresquem o isco como de costume, mas antes de o colocar no frigorífico façam mais uma alimentação. Existem casos de pessoas que se esquecem durante dois ou três meses e após um ou dois refrescamentos a cultura volta à sua vida normal. Se quiserem prevenir estes acidentes, também podem secar a vossa cultura para terem sempre uma reserva. Em último caso, podem começar uma nova cultura.

Fiz tudo o dizia no blog e o isco não cresceu. Fiz algo mal?
Provavelmente não. A receita é tão simples que o factor humano poucas vezes afecta o resultado da preparação de um isco. Pode ser da temperatura, terem uma casa mais fria (abaixo dos 20ºc) pode fazer as coisas demorarem mais tempo. Tentem alimentar de 24 em 24 horas ao invés de 12 em 12. Outro factor que por experiência pessoal posso dizer que tem muita influência, é a qualidade da farinha. Escolham uma farinha ecológica e de preferência moída em mó de pedra pois desta maneira filtram-se menos nutrientes e vitaminas que as leveduras gostam.

Porque tenho de deitar parte do isco fora antes de cada refrescamento?
Não precisam. A razão pela qual eu faço é porque uso a proporção 1:2:2 (isco:farinha:água) em cada refrescamento. Se tiverem 200 gramas de isco e quiserem refrescá-lo têm de adicionar 400g de água e 400g de farinha. Da próxima vez, têm 1kg de isco, sendo assim têm de adicionar 2kg de farinha e 2kg de água e por aí fora. No entanto, se ficarem viciados (pode acontecer) em fazer pão caseiro, quiserem fazer muitos pães no mesmo dia e precisarem de uma grande quantidade de isco, podem deixar mais isco no frasco. Por exemplo, se quiserem ter sempre 500g de isco disponível, deitem fora tudo expecto 100 gramas de isco e adicionem 200g de farinha e 200g de água. Simples, não é?

O mesmo processo funciona com farinha de trigo?
Em princípio sim. Na minha opinião, é mais fácil começar um isco de centeio e depois usar esse isco de centeio para começar um isco de trigo.
Esta secção de Perguntas e Respostas há de ser actualizada regularmente com as vossas perguntas.
04.Jan.11

Isco (ou crescente?)

Penso que tenho usado o termo crescente incorrectamente.

 

Existe outra palavra na língua portuguesa que está relacionada com a panificação e estas leveduras selvagens: isco. Se formos ao Dicionário Priberam este diz-nos que isco significa um fermento na sua maior força, coisa que soa um pouco estranha e não esclarece. Se continuarmos a procurar na internet, eventualmente chegamos a esta página (escrita pela autora deste blog que não conhecia e parece fantástico) que oferece algum esclarecimento sobre alguns termos.

 

Como podem ler, isco ou massa azeda parecem a palavra certa para o que eu anteriormente chamei crescente. Pessoalmente, vou excluir a palavra massa azeda do vocabulário usado no blog por duas razões. Os iscos que mantenho e descrevo no blog sao 1 parte de água para 1 parte de farinha (ou 100% de hidratação no vocabulário técnico de padaria) e não se parecem de todo com uma massa. A segunda razão é a de que um isco não é necessariamente azedo. Nas primeiras horas após uma alimentação o isco tem um sabor e cheiro ameno que faz lembrar natas ou leite.

 

No entanto, eu ia jurar que já ouvi a palavra crescente com o mesmo sentido da palavra isco. Será dependente da região? A nossa língua tem dessas coisas.

 

Continuando pela blogosfera encontrei este post que deu alguma luz sobre o que é então um crescente. Afinal parece que era eu que estava errado. Possivelmente pelo facto de tudo o que sei sobre pão ter vindo de livros ou blogs na língua inglesa e na maior parte das vezes ter dificuldade em encontrar termos adequados na minha língua materna.

 

Vamos então esclarecer os termos.

Isco: Cultura de leveduras selvagens que é criada misturando farinha e água que é deixada a fermentar à temperatura ambiente durante alguns dias. Posteriormente, tem de ser alimentada (refrescada) regularmente para manter as leveduras vivas. No caso do padeiro caseiro, é normalmente mantida no frigorífico e refrescada uma vez por semana, sendo que nas padarias é comum ter o isco à temperatura ambiente e refrescá-lo duas a três vezes por dia. Em inglês corresponde ao termo sourdough starter ou simplesmente starter.

 

Crescente: Um pré-fermento criado normalmente no dia antes de se fazer a massa final, podendo ser chamado de massa velha ou esponja dependo da consistência. Em inglês normalmente diz-se pre-fermentpoolish ou sponge. Em francês, levain ou paté fermenté. Em italiano, também temos a biga. São todos crescentes diferentes que produzem resultados diferentes.

 

Querem ajudar ao esclarecimento? Têm opinião sobre o assunto? Se tiverem possibilidade, até podem perguntar à padaria da esquina. Certamente o vosso padeiro vai ficar contente por perguntarem sobre estas coisas.

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