Tipos de fermento
Tão iguais e ao mesmo tempo tão diferentes são os tipos de fermento que se usam para pão. Diferentes texturas, diferentes propriedades, aspecto diferente mas no fundo o mesmo tipo de levedura. Começando da esquerda para a direita no sentido dos ponteiros do relógio, temos fermento fresco de padeiro, fermento selvagem ou isco (ainda estou a investigar se é o nome correcto) e por último o fermento em pó ou granulado. O primeiro e o último pertencem à categoria de fermento fabricado/industrial e o outro é um fermento natural.
Até aos finais do século XIX o fermento mais utilizado era o fermento selvagem, normalmente personalizado por um pedaço de massa velha que era guardado de fornada em fornada. Nestes tempos, ninguém percebia muito bem como a fermentação funcionava e também não se preocupavam com isso. Limitavam-se a atribuir o processo a uma causa divina qualquer (em Portugal, nalgumas terras ainda se tem de a tradição de dizer uma benção quando se deixa o pão a levedar).
As coisas continuaram assim, até um senhor chamado Louis Pasteur, também responsável pelos processos de pasteurização, ter descoberto que a fermentação ocorria graças a um organismo vivo: a levedura. Pasteur, ele próprio muito religioso, acabou por aceitar o paradoxo da sua descoberta, ao argumentar que a levedura era também em si uma criação de Deus. A fermentação continuaria assim a ser um processo com alguma intervenção divina. A ciência pegou na sua descoberta e tomou as rédeas da selecção natural e escolheu as espécies de levedura mais fortes (i.e. levedam mais rápido) para produzir o fermento fabricado. Os padeiros jubilaram de alegria e o fermento selvagem caíu em desuso. Começara a era da industrialização do pão.
Gosto de História, mas vamos lá falar de fermentos. Qual devemos usar? Como devem ser usados? Qual o melhor?
Não existem grande diferença entre o fermento fresco e o fermento granulado. São ambos a mesma espécie de levedura, produzem os mesmos tempos de levedação e portanto pode-se substituir um pelo outro em qualquer receita. A fórmula a ser usada é: fermento granulado (g) = 0.4 x fermento fresco (g), que significa que numa receita que use 10 gramas de fermento fresco podemos usar 4 gramas de fermento granulado e não afectar em nada o resultado da receita. É uma boa dica a reter. A grande diferença é que o fermento fresco tem uma validade de três semanas após a data de fabrico ao quanto que o granulado tem validade de um ano se a embalagem não tiver sido aberta. Além disso, o fermento fresco deve ser sempre dissolvido em água antes de se adicionar a farinha ao passo que o granulado pode ser adicionado e misturado com a farinha. Pessoalmente, acho o fermento granulado mais prático.
Por outro lado, o fermento selvagem é um tanto quanto diferente do fermento fabricado e, que eu saiba, não existe nenhuma fórmula de conversão directa. A principal diferença é que este leveda mais lentamente, mas ao fazer isto dá tempo a outro tipo de organismo presente numa massa de pão fazer o seu trabalho: as bactérias. "Credo! Bactérias!" - dizem vocês, mas estas são das boas. As bactérias presentes numa massa produzem ácido láctico e ácido acético e contribuem para um sabor mais complexo. Segundo DiMuzio, um pão com uma pequeníssima quantidade de fermento de fabrico leveda pães em cerca de 1-2 horas, ao quanto que as bactérias precisam de pelo menos 3-4 horas para produzirem estes ácidos. Todavia, é possível obter resultados parecidos com o fermento fabricado recorrendo ao uso de pré-fermentos (tema para outro post no futuro). O próprio isco é um pré-fermento de leveduras selvagens.
Resumindo, não existe nenhum fermento melhor que o outro. Todos têm características diferentes que podem ser/são usadas pelo padeiro para obter resultados diferentes. O que devia ser a maior aprendizagem deste post é que os tempos de levedação são importantes e não devem ser apressados. Aumentar a quantidade de fermento numa massa ou coloca-la a levedar num ambiente mais quente para que esta levede mais depressa produz pão num curto espaço de tempo, mas também produz um pão menos interessante.